quinta-feira, 21 de março de 2013

sobre berros e acordes


...em tempo de desordem sangrenta,
de confusão organizada,
de arbitrariedade consciente,
de humanidade desumanizada,
nada deve parecer natural.
Nada deve parecer impossível de mudar.
Bertolt Brecht


Noite pouco fria, espaço já bem íntimo de muitos ali presentes, entre ACORDES dissonantes e BERROS alarmantes uma tentativa de debate, frustrada.

Umas propostas muito boas, outras nem tanto, a palavra diversidade em alta, uma torcida organizada de ouvidos tapados. Aplausos como os de um show.

Queremos uma revolução, sem revolução? Só somando as diferenças e acordando com governos, ditos favoráveis?

Uma frase: “o momento político deve ser considerado”, veio do lado direito de quem vê. Que momento estamos? Conseguimos realmente fazer uma análise de conjuntura e perceber um movimento sinuoso ao centro da social democracia? Acordos são os acordes dissonantes de um governo que deveria ser berrante e popular, mas que abre as pernas para as regras do capital. Taí companheiros e companheiras, nosso momento político considerável? E poderia ser outro? Desse “mais do mesmo” não estamos enjoados?

Me parece que nos unirmos em cooperativa é um ato que legitima nossa precariedade de trabalhadores  e trabalhadoras artistas (e não reconhecidos (as)) que somos. Que bom que a luta de companheiros e companheiras no passado nos garantiu, pelo menos, termos a entidade e uma lei para, assim, existir nossa arte, nossas diferentes linguagens e estéticas. Bem sabemos o quanto é difícil e desesperador quando não conseguimos garantir a materialidade para podermos criar. Que pena que a luta dos nossos companheiros e companheiras no passado não é considerada quando uma pergunta leviana acusa uma pessoa que tem grande importância histórica para nossa categoria e que em minutos (e com urros) é ridicularizada. E o pior, alguns dos companheiros do outro lado se deliciam com sarcasmo no olhar. É isso “estar junto”? Daí, a assembleia virou o “mais do mesmo” que os Acordes disseram estar enjoados.

Onde estamos afinal, companheir@s? Aliás, somos mesmo companheir@s? E a tal da diversidade?

Parecia que quanto mais idílica a história idealizada, mais aplausos recebia e mais perversa se tornava. Em uma das falas, a acusação para a atual gestão sobre “Burocráticos aprisionados na máquina política”, negligência e camuflagem, posturas sectárias, Capitanias hereditárias...  Mas nesta atual gestão não temos integrantes de ambas as chapas? E pergunto para a chapa que propõe acabar com isso, porque os integrantes que hoje fazem parte da diretoria ainda não o fizeram? Porque temos contradições que vão além de uma simples idealização de mudança, além de uma organização trabalhista de uma entidade.  Está mais do que na hora de conseguirmos olhar essas contradições e analisá-las, para sermos menos engolidos.

Da esquerda, pela primeira e única vez, a palavra “radical”. E parece que ela assusta. Assusta quem esquece que fez história. Sim vamos às raízes, vamos à nossa trajetória de luta que é árdua.

Vamos fazer realmente uma análise de onde estamos? O resultado da última edição do fomento foi bem significativo. Grupos que muito contribuíram para a elaboração da lei, que forraram a cama onde podemos dormir (um pouco sossegados) ficaram de fora e não berramos nada.  Mais uma vez a comissão teve que, miseravelmente, excluir e TUOV, ENGENHO TEATRAL, COMPANHIA DO LATÃO, FRATERNAL CIA DE ARTES E MALASARTES e outros tantos que deveriam receber também pelo o fato de continuarem resistindo, deveriam ter um fomento vitalício e ainda disputam migalhas e nós nem uma carta ou um ato de repúdio coletivo conseguimos elaborar.

“O contrário de igualdade não é diversidade e sim desigualdade.” Não deveríamos levantar a bandeira da diversidade, pois isso já fazemos (e muito), é só olhar para os coletivos e para os integrantes que compõe as chapas, muita diversidade... até política. Deveríamos sim lutar contra a desigualdade que nos é imposta e que naturalizamos a cada dia.

Ou somos felizes por, muitas vezes, abrirmos mão da nossa criação estética por falta de verba e vendermos nossa força de trabalho?
Política não se faz em redes sociais. Política se faz no dia a dia de uma luta pela existência, que tem que deixar de ser precária. Quando pararmos de lutar para simplesmente existirmos, ai sim companheirada, a gente muda não só a COOPERATIVA PAULISTA DE TEATRO, mas o mundo e isso deve ser, no mínimo, a nossa pretensão!

Um acorde para ser perfeito pressupõe a produção simultânea da tônica, da dominante e da subdominante. Isso não é hierárquico?

Mea culpa assumida foi motivo de aplauso. Patético.

A mudança só virá da nossa luta, do poder público não se pode esperar.

Lembrando, que sempre alguém desaparece da história: nós. O pior é quando isso é feito por nós mesmo.

Em tempo de ordem e acordes harmônicos é mais difícil ver as contradições, mesmo.

O que ouvi foram aplausos para as não respostas da chapa ACORDES. Só faltou o gesto famoso do coraçãozinho com as mãos e o “Existe amor na Cooperativa Paulista de Teatro”.

A chapa BERRO propõe continuidade e inovação juntas. A ética ficou com essa chapa. Ganhando ou perdendo, tanto faz. Me orgulho de compartilhar experiências, pensamentos, críticas e luta com vocês berrantes. O moralismo a gente joga pra merda, se tem gente que ainda gosta de pegar e se sujar, que vá...

A assembleia estava tão surda que pouco ouviu a sugestão de critérios objetivos para a gestão. Nós é que vamos cria-los e depois de um tempo perceber suas contradições. Hoje li numa postagem de rede social que a proposta da chapa BERRO se resume a berrar regras e impor um olhar fixo. Ora Dionísio, nos embriagamos tanto de alienação que seguimos as frases feitas e não conseguimos nem ler em um papel ou site e entender as reais propostas? É triste, mas é o que acontece (e muito).

Nas “lutinhas” segmentadas e sectárias, onde defendemos causas no particular frente ao verdadeiro inimigo que nos oprime só vai fazer que nos odiemos uns aos outros. E quem mais faz isso, mais aplaudiu falas vazias, o nada no debate. E o mais triste, acreditando que estavam recheadas.

A nossa luta é bem maior, a nossa categoria tem que transbordar para além dela.

Nós fizemos história. Não podemos andar para frente sem olhar o passado.

Espero que acordes. Se não acordais, eu BERRO! NÓS BERRAMOS! E vamos CONTINUAR  berrando e concretizando ações, independente do que houver... 

Andressa Ferrarezi
madrugada de 21/03/2013


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