domingo, 14 de março de 2010

apresentação extra - conjugado




No próximo sábado, às 21h, apresentação extra do CONJUGADO no espaço do feijão.

ÚLTIMA APRESENTAÇÃO.

R. Teodoro Baima, 68
República - Centro
Telefone:3259-9086
Reservas: 8262-8479 / 8524-8938



quinta-feira, 11 de março de 2010

13 mil moradores de rua

matéria tirada do Folha Cotidiano:


SP TEM 13 MIL MORADORES DE RUA, DIZ CENSO

Nova contagem, que será divulgada pela prefeitura, mostra que a capital ganhou 4.000 desabrigados em nove anos.
Aumento no uso de drogas, falha em políticas sociais e desemprego são explicações, dizem especialistas; albergues têm cerca de 7.000 vagas.

DA REPORTAGEM LOCAL

Novo censo feito no fim do ano passado e que será divulgado pela Prefeitura de São Paulo nos próximos dias mostra o que a maioria dos paulistanos já percebeu: é crescente o número de moradores de rua, cada vez mais espalhados por bairros onde a situação era incomum.
Os dados do recenseamento, que trará informações por bairro, idade e sexo, apontam que 13 mil vivem hoje nas ruas.
Para eles, há pouco mais de 7.000 vagas em albergues da prefeitura -eram 8.000, mas no ano passado uma unidade fechou. Conclusão: quase 6.000 não têm onde dormir. E, mesmo assim, sobram vagas.
Em 2000, quando foi feito o censo anterior pela Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas), da USP, eram 8.706 pessoas nessa situação -3.693 em albergues. Ou seja, em nove anos, as ruas ganharam mais de 4.000 pessoas, um aumento de quase 50%.
No período, segundo dados da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano, a população da capital cresceu 5%.
Há várias explicações para isso, nenhuma delas completa: aumento do consumo de drogas -principalmente do crack- e álcool, desemprego e falha em políticas sociais.
Para Camila Giorgetti, doutora em sociologia pela PUC-SP e pelo Instituto de Estudos Políticos de Paris e pesquisadora do Observatório Europeu dos Sem-Teto, o fenômeno se deve principalmente à inadequação dos programas assistenciais.
Para ela, é preciso evitar que pessoas cheguem às ruas e garantir a volta rápida às famílias.
Um educador de rua -que, por questão de segurança, não será identificado- é taxativo: a culpa é da droga. No caso, do crack, que leva pessoas a abandonarem trabalho e família.
A Folha acompanhou o trabalho dele, a maior parte do tempo feito na cracolândia, no centro. Ele diz ser comum aparecer gente nova, na maior parte pessoas de até 30 anos.
O que confirma constatação do censo da Fipe: há mais jovens morando nas ruas. A isso também se atribui o crescimento da presença de usuários de drogas entre essa população. Mas a maioria deles ainda é mais velha, acima dos 40. E o álcool continua um problema.
Outra explicação para o fato é o desemprego. Por isso, na opinião de especialistas, o poder público precisa manter programas de qualificação profissional e geração de postos.
"É preciso ter projetos que possibilitem a saída natural da rua. Nas duas últimas gestões, só mantinham albergue e até fecharam vagas", diz Alderon Costa, coordenador da Rede Rua, que administra albergues.
A prefeitura informou que o fechamento do albergue ocorreu por falta de segurança para usuários e funcionários.
A política do governo, segundo Alda Marco Antonio, vice-prefeita e secretária de Assistência e Desenvolvimento Social, é "fortalecer as famílias para diminuir a entrada de pessoas na rua".

(EVANDRO SPINELLI, ANDRÉ CARAMANTE e LETÍCIA DE CASTRO)

RIO: POPULAÇÃO VIVENDO NAS RUAS DA CIDADE É DE QUASE 5.000 PESSOAS

No Rio, existem de 4.600 a 4.800 moradores de rua, segundo o secretário de Assistência Social, Fernando Ferreira. Ele diz que cerca de 2.800 são atendidos em abrigos públicos ou conveniados e que os demais ficam nas ruas. Já em Salvador, o número de moradores de rua caiu 37% no ano passado em relação aos dois anos anteriores, diz a prefeitura.

SEM-TETO CRITICAM ALBERGUES E ABORDAGEM DA GUARDA MUNICIPAL

Eles afirmam que abrigos não têm higiene ou segurança e dizem preferir ficar nas ruas

ANDRÉ CARAMANTE
DA REPORTAGEM LOCAL

Ex-dono de uma adega perto do aeroporto de Congonhas, na zona sul de São Paulo, Manoel Domingos da Rosa Neto, 41, vive há três anos numa esquina na Bela Vista. Diz ter perdido tudo devido a brigas familiares. Nas ruas, conheceu Sirlei dos Santos, 22, sua atual mulher.
Ela usa uma lata de tinta de 18 litros adaptada como fogão. Também na esquina, o casal toma banho com a água conseguida num lava-rápido. "O que tem deixado a gente muito triste é o fato de que a Guarda Civil Municipal tenta todo dia tirar a gente daqui e sempre age com desrespeito. A gente não quer viver em albergue. Tem muita violência e falta de higiene."
Na esquina onde vive, ele ganhou fama como pedreiro dos bons. "Tem gente que me dá R$ 7.000 para comprar material. Não é porque a gente está na rua que não merece respeito."
José, 30, também critica os albergues. Mineiro da cidade de Passos, ele vive nas ruas das imediações da praça da Sé há 18 anos, depois de perder pai e mãe num incêndio na favela onde viviam.
Enquanto contava sua situação, olhava para o céu e torcia para mais um temporal desabar. Assim, venderia os dez guarda-chuvas novos que segurava -é como ele ganha os R$ 50 por dia que gasta com três refeições e com maconha.
"Quem trabalha com gente da rua precisa entender que [na rua] tem de tudo. Tem quem está nela porque quer; os que estão por necessidade e os encostados, que se fazem de coitadinhos. É preciso saber separar e oferecer o que cada um precisa", diz Alves.


MORADORES DE HIGIENÓPOLIS E DO PACAEMBU RECLAMAM DE "INVASÃO'

Albergues fechados e ações policiais na cracolândia levaram sem-teto para esses bairros

LETICIA DE CASTRO
DA REPORTAGEM LOCAL

Bairro nobre da região central de São Paulo, o Pacaembu virou um dos principais destinos de moradores de rua exilados pelas operações policiais da cracolândia e pelo fechamento de albergues no ano passado.
Segundo os moradores do bairro, o principal foco é a praça Wendel Wilkie. "Ela está completamente invadida. Da janela do meu apartamento vejo as pessoas cozinhando, urinando, defecando, até fazendo sexo", afirma a comunicóloga Ilva, que mora em um prédio localizado em frente à praça e hoje vive com as janelas fechadas por causa do mau cheiro.
Para impedir esse tipo de ocupação, os moradores querem fechar a praça com grades.
"Ela ficaria aberta de dia e, à noite, seria fechada e vigiada por guardas", diz Sonia Lopes, moradora do primeiro andar do mesmo edifício.
Em outra praça, a Ana Maria Popovic, a sujeira e a fumaça provocada pelas fogueiras dos moradores de rua são a principal queixa do engenheiro civil Rodrigo Mauro, 28.
Vizinho ao Pacaembu, o nobre Higienópolis também viu suas ruas arborizadas serem ocupadas pelos sem-teto.
Em Santa Cecília, a realidade se repete. Para Luiz Felipe Pereira Penha, 49, morador e proprietário de vários imóveis no bairro, os moradores de rua não são agressivos nem violentos. Mas "com eles vêm a bandidagem, traficantes e usuários de drogas", provocando uma sensação de insegurança.


coisas para mover

Neste momento estamos em franca SobrePosição com os companheiros da Cia. Do Feijão.
Aí vão algumas coisas que têm povoado nossos encontros.


JOÃO DO AMOR DIVINO
(Gonzaguinha)

39 anos de batalha, sem descanso, na vida
19 anos, trapos juntos, com a mesma rapariga
9 bocas de criança para encher de comida
Mais de mil pingentes na família para dar guarida
Muita noite sem dormir na fila do INPS

Muita xepa sobre a mesa, coisa que já não esclarece
Todo dia um palhaço dizendo que Deus dos pobres nunca esquece
E um bilhete, mal escrito
Que causou um certo interesse

É que meu nome é
João do Amor Divino de Santana e Jesus
Já carreguei, num guento mais,
O peso dessa minha cruz
Sentado lá no alto do edifício
Ele lembrou do seu menor
Chorou e, mesmo assim, achou que
O suicídio ainda era o melhor

E o povo lá embaixo olhando o seu relógio
Exigia e cobrava a sua decisão
Saltou sem se benzer por entre aplausos e emoção
Desceu os 7 andares num silêncio de quem já morreu
Bateu no calçadão e de repente
Ele se mexeu

Sorriu e o aplauso em volta muito mais cresceu
João se levantou e recolheu a grana que a platéia deu

Agora ri da multidão executiva quando grita:
"Pula e morre, seu otário"
Pois como tantos outros brasileiros
É profissional de suicídio
E defende muito bem o seu salário







A MÁQUINA DO MUNDO
(Carlos Drummond de Andrade)



E como eu palmilhasse vagamente
uma estrada de Minas, pedregosa,
e no fecho da tarde um sino rouco

se misturasse ao som de meus sapatos
que era pausado e seco; e aves pairassem
no céu de chumbo, e suas formas pretas

lentamente se fossem diluindo
na escuridão maior, vinda dos montes
e de meu próprio ser desenganado,

a máquina do mundo se entreabriu
para quem de a romper já se esquivava
e só de o ter pensado se carpia.

Abriu-se majestosa e circunspecta,
sem emitir um som que fosse impuro
nem um clarão maior que o tolerável

pelas pupilas gastas na inspeção
contínua e dolorosa do deserto,
e pela mente exausta de mentar

toda uma realidade que transcende
a própria imagem sua debuxada
no rosto do mistério, nos abismos.

Abriu-se em calma pura, e convidando
quantos sentidos e intuições restavam
a quem de os ter usado os já perdera

e nem desejaria recobrá-los,
se em vão e para sempre repetimos
os mesmos sem roteiro tristes périplos,

convidando-os a todos, em coorte,
a se aplicarem sobre o pasto inédito
da natureza mítica das coisas,

assim me disse, embora voz alguma
ou sopro ou eco ou simples percussão
atestasse que alguém, sobre a montanha,

a outro alguém, noturno e miserável,
em colóquio se estava dirigindo:
"O que procuraste em ti ou fora de

teu ser restrito e nunca se mostrou,
mesmo afetando dar-se ou se rendendo,
e a cada instante mais se retraindo,

olha, repara, ausculta: essa riqueza
sobrante a toda pérola, essa ciência
sublime e formidável, mas hermética,

essa total explicação da vida,
esse nexo primeiro e singular,
que nem concebes mais, pois tão esquivo

se revelou ante a pesquisa ardente
em que te consumiste... vê, contempla,
abre teu peito para agasalhá-lo.”

As mais soberbas pontes e edifícios,
o que nas oficinas se elabora,
o que pensado foi e logo atinge

distância superior ao pensamento,
os recursos da terra dominados,
e as paixões e os impulsos e os tormentos

e tudo que define o ser terrestre
ou se prolonga até nos animais
e chega às plantas para se embeber

no sono rancoroso dos minérios,
dá volta ao mundo e torna a se engolfar,
na estranha ordem geométrica de tudo,

e o absurdo original e seus enigmas,
suas verdades altas mais que todos
monumentos erguidos à verdade:

e a memória dos deuses, e o solene
sentimento de morte, que floresce
no caule da existência mais gloriosa,

tudo se apresentou nesse relance
e me chamou para seu reino augusto,
afinal submetido à vista humana.

Mas, como eu relutasse em responder
a tal apelo assim maravilhoso,
pois a fé se abrandara, e mesmo o anseio,

a esperança mais mínima — esse anelo
de ver desvanecida a treva espessa
que entre os raios do sol inda se filtra;

como defuntas crenças convocadas
presto e fremente não se produzissem
a de novo tingir a neutra face

que vou pelos caminhos demonstrando,
e como se outro ser, não mais aquele
habitante de mim há tantos anos,

passasse a comandar minha vontade
que, já de si volúvel, se cerrava
semelhante a essas flores reticentes

em si mesmas abertas e fechadas;
como se um dom tardio já não fora
apetecível, antes despiciendo,

baixei os olhos, incurioso, lasso,
desdenhando colher a coisa oferta
que se abria gratuita a meu engenho.

A treva mais estrita já pousara
sobre a estrada de Minas, pedregosa,
e a máquina do mundo, repelida,

se foi miudamente recompondo,
enquanto eu, avaliando o que perdera,
seguia vagaroso, de mãos pensas.